(Chet Baker no cd-player)
Já lá vão uns anos mas nunca hei-de deixar desvanecer a memória daquela semana...
Tinha voltado de casa dos meus avós e apetecia-me sair, arejar a cabeça. Encontrei o meu amigo P. e perguntei aonde ia nessa noite. Ele confessou-me que havia dois dias que ia com a M. e o T. para um café para os lados da Solúm, tudo porque havia lá uma rapariga que andava a pôr o pessoal "doido". Desenhou-me a imagem dela como se fosse a flor mais bela do mundo.
Nesse mesmo dia fui com ele ao dito café. Ela já lá estava... e nicles... olhei para ela e pareceu-me apenas uma miúda de cabelo pintado. Nesse instante pensei como poderia o meu amigo P. achar aquela rapariga estonteante. Não senti o efeito "máquina centrifugadora". Debati isso como o P.
No dia seguinte lá estava eu, no carrossel do charuto com a M., P., A. e o T.
Ao terceiro dia... Entrei no café, fui mais cedo do que o costume, encontrei-a sozinha numa mesa. Sentei-me, olhei para ela e falámos. Mas eu realmente não olhava para ela, olhava para os seus olhos, para a profundidade do labirinto a que eles me conduziam. Eu não prestava atenção ao que nos escapava da boca, entrei no labirinto e não sabia como sair e achei a ideia de Ícaro a mais parva de todas, porquê fugir? Aquela imensidão era a mais bela sedução que tinha sentido, aqueles vitrais eram a pintura mais bela que alguma vez tinha presenciado. Do centro da íris dispersavam-se pequenos raios, feitos de propósito para hipnotizar.
Nesse mesmo dia, quando chegou a meia-noite, fomos em grupo escolta-la a casa. Ela aproximou-se e colocou a mão no bolso do meu casaco, e apertou-a contra a minha, e assim fomos até casa dela. Mal ela subiu, alguns disseram, ela costuma fazer isso às vezes...mas eu ainda não tinha achado a saída...nem sequer procurado.
Passado um dia, pedi-lhe namoro, como se pede quando ainda se acredita. Ela foi algumas vezes dormir a casa da avó no Bairro. Aproveitamos alguns desses dias para ficar a conversar num banco junto ao ringue até a noite ser longa, muitas vez os nossos lábios se aproximaram, sem nunca se tocarem. Ela não aceitou. Gostava de mim... mas eu assustei-a. Soube pelo amigo comum J.V. que ela sentia atracção por mim, mas ao fim de uma semana não se sentia bem a assumir alguma coisa.
Passadas duas semanas as coisas desmoronaram-se. Pseudo namorei uma outra rapariga, acho porque queria mostrar a mim mesmo que nenhuma fêmea me ia pregar uma rasteira. A rapariga de cabelo pintado, passados uns dias disse-me: "Ela podia ser mais gira, não achas..."
I fall in love too easily, I fall in love too fast...
Agora já não consigo ficar enamorado pela imagem de uma mulher, talvez tenha gasto o meu solitário crédito com aqueles olhos de gata.